domingo, agosto 19, 2007

Portugal e o seu Futuro, por João Mattos e Silva

Portugal e o seu Futuro
João Mattos e Silva* (Ago-2007)
É quase impossível, para quem não se limita a ser português por determinismo geográfico, não comentar as declarações do escritor e Prémio Nobel José Saramago, de que Portugal haverá de integrar-se politicamente em Espanha, constituindo um grande país ibérico. Saramago não será o único a pensá-lo, mas foi dos poucos a dizê-lo alto e bom som. Não sei se ele é iberista, à moda do século XIX. Calculo que não está a pensar numa Europa federal, dominada por uma perspectiva liberal, ele que é militante do PCP que é ferozmente contra a UE e marxista-leninista. Como sei que não estará a pugnar por uma grande monarquia ibérica em que as nacionalidades estejam unidas sob a Coroa dos Bórbons.
Saramago estará, vendo de Espanha, a constatar uma realidade, que é a de que o país vizinho, pela pujança da sua economia vai a pouco e pouco dominando o mercado português em muitos sectores e que a economia é determinante nas escolhas políticas. Esta a sua constatação pragmática. Porque a sua utopia está expressa há muitos anos num romance: a península ibérica separando-se da Europa, revolucionária, comunista.
A indignação que dominou algumas boas almas, incluindo comentadores habituais da nossa comunicação social, deveria centrar-se menos no escritor e mais nas razões, que ele não enunciou, que levam a que muitas pessoas – segundo uma sondagem, 25% de portugueses – vejam numa integração num estado peninsular uma solução para a aparente falta de solução de Portugal. Razões que são sobretudo económicas mas também políticas.
Se é verdade que a questão das nacionalidades tem vindo a crescer em algumas regiões espanholas, que os povos que se não revêem no predomínio da velha Castela vão acentuando esse sentimento na manifestação das diferenças históricas e culturais, desde logo pelo uso ostensivo da língua na sua comunicação, é também verdade que o que constitui um fortíssimo elemento agregador é a Coroa. Por isso os independentistas se proclamam republicanos e rejeitam a Monarquia espanhola.
O poder agregador da Monarquia – não foi por acaso, mas por um acto de inteligência, que o PSOE desde sempre republicano e o PCE aceitaram e apoiaram a monarquia como factor de fortalecimento do Estado, depois do franquismo – é um facto e o fascínio pela dinastia uma realidade que funciona como uma força centrípeta. Quer se queira ou não, a Monarquia é uma das principais forças de atracção e de afirmação interna e externa da Espanha moderna. Os espanhóis sabem-no e os portugueses, mesmo se não o dizem, também sabem.
Ao olharmos para esses sinais de iberismo, que não são ainda de alarme, seria bom determo-nos em todos os aspectos que o motivam. Os mais objectivos e os mais subjectivos, os mais visíveis e os mais ocultos. Sabem-no os monárquicos que o Rei garante melhor a independência externa da Nação e do Estado – porque é a presença do passado que se projecta no futuro – do que um Presidente que é apenas, por escassos anos, um pedaço do presente e pode ser, como já foi entre nós, um federalista, ou poderá mesmo ser um iberista. Aos que querem preservar a independência de Portugal dentro do quadro Europeu convido a que meditem também na forma do regime, de forma desapaixonada. Porque o País é mais importante do que qualquer preconceito, como o caso espanhol é demonstrativo

1 comentário:

Laurus nobilis disse...

Eis uma análise que me deu prazer ler. Só não concordo quando se diz que "...sinais de iberismo, que não são ainda de alarme...". Para mim, basta andar na rua e falar sobre o assunto. Neste momento, as pessoas confundem tudo, sobretudo quando o pão começa a escassear na mesa...